segunda-feira, 27 de dezembro de 2010
segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010
Naquele Tempo
Perfume e Realidade
Certa noite, o Mestre Bahaudin estava sentado, após o jantar, rodeado de um grande número de recém-chegados, jovens e velhos, todos desejosos de aprender.
O silêncio se fez, e o Mestre pediu que lhe fizessem uma pergunta:
- Qual é o obstáculo maior para o aprendizado e para o ensinamento do Caminho? - perguntou alguém.
O Mestre respondeu:
- As pessoas julgam segundo as aparências. Elas são atraídas pelos sermões, os barulhos e os rumores, e por tudo aquilo que os excita - como as abelhas pelo perfume das flores.
- Então como devem as pessoas se aproximarem da sabedoria, ou as abelhas das flores?
- O ser humano se aproxima da sabedoria pelos rumores e barulhos, os sermões e os livros, e em estado de excitação. Após se terem assim aproximado, eles ficam na proximidade mas somente para pedir ainda a mesma coisa e não por aquilo que a sabedoria pode dar - aquilo pelo qual ela ali está.
É o perfume que guia a abelha até a flor, mas, tendo chegado à proximidade da rosa, ela não se contenta em pedir mais perfume: ela se dispõe a recolher o pólen. Este néctar que ela deverá colher, é o equivalente da realidade da sabedoria da qual os rumores e imaginações são, de certa forma, o perfume.
A humanidade só conta com um pequeno número de “verdadeiras abelhas”. Enquanto que quase todas as abelhas são abelhas por sua aptidão para recolher o néctar, a maioria dos seres humanos não são ainda seres humanos - seres preparados para perceber aquilo que eles foram criados para perceber.
E o Mestre falou:
- Que aqueles que vieram aqui a Quasr al-Arifin, por causa do que leram, se levantem.
Muitos se levantaram.
- Que aqueles que chegaram até nós porque escutaram falar de nós, se levantem igualmente.
Foi ainda maior o número dos que se levantaram.
- Aqueles que ficaram sentados - retomou Bahaudin - estes vieram por que perceberam nossa presença e nossa verdade de uma outra forma, de maneira sutil.
- Entre aqueles que estão de pé, velhos ou jovens, há muitos que só querem ser sempre estimulados, cada vez mais, em seus sentimentos e procuram a excitação ou a tranqüilidade. Antes que eles possam aprender aquilo que não podem experimentar em outro lugar, eles deverão pedir o conhecimento e não a diversão e o espetáculo.
Depois ele disse o seguinte:
- Existem aqueles que são atraídos pela reputação de um mestre, e eles vêm lhe ver desejosos de experimentar ainda mais intensamente a mesma sensação. Quando este morre, eles visitam sua tumba, sempre pela mesma razão.
Enquanto suas aspirações não tiverem sido transformadas, como por alquimia, eles não encontrarão a verdade.
Depois há aqueles que visitam um mestre não porque eles escutaram falar dele como um conselheiro sábio e experimentado ou, se ele está morto, porque desejam ver sua tumba, mas por que eles reconhecem sua realidade profunda. Um dia virá onde cada um possuirá esta faculdade.
Então Bahaudin, o Desenhista, diz:
- Mas, enquanto se espera, o trabalho que será finalmente realizado através das gerações deverá ser realizado dentro de um mesmo indivíduo. Para tornar-se um Moisés, se terá que transcender o Faraó. O homem que é atraído pela reputação deverá tornar-se, de uma certa maneira, um outro homem. Ele deverá tornar-se aquele que habita nas proximidades da sabedoria por que sentiu sua realidade profunda.
Este é o objetivo deste Trabalho, antes que ele possa aprender. Enquanto não aprender isso, ele é só um dervixe. O dervixe deseja. O sufi percebe.
Poesia Sufi
domingo, 21 de fevereiro de 2010
Abelha branca
Abelha branca oriental, tu zumbes ébria de mel em minha alma, e te torces em lentas espirais de saudades.
Eu sou o desesperado, a palavra sem o mínimo eco.
O que tudo eu perdi, o que tudo eu já tive, o que tudo eu vi.
Algema extrema - tange em ti a minha ânsia última.
Em minha pátria deserta, és tu, a última rosa selvagem.
Ah, silenciosa!
Fecha os teus olhos pretos profundos, pois em breve atraca a noite
Ah, desnuda o teu corpo de estátua branca e temerosa!
Bruxuleia com a tua pálida cor quente esta noite tenebrosa.
Tens profundos os olhos, que em meu lugar a noite se esconde.
Frescos braços de flor e regaço manso de rosas.
Teus seios se assemelham a caramujos brancos ovalados.
Ah, silenciosa!
É aqui o ermo de onde estás ausente.
Chove! São lágrimas verticais de saudades.
O vento do mar caça teimosas gaivotas que bicam as minhas doridas lembranças.
A água anda sem rumo pelas ruas molhadas.
Queixam-se como enfermos, naquela árvore solitários pássaros, cúmplices meus nesta soledade.
Eráclito Alírio da silveira
Abeja blanca zumbas...
Abeja blanca zumbas, ebria de miel, en mi alma
y te tuerces en lentas espirales de humo.
Soy el desesperado, la palabra sin ecos,
el que lo perdió todo, y el que todo lo tuvo.
Última amarra, cruje en ti mi ansiedad ultima.
En mi tierra desierta eres la ultima rosa.
Ah silenciosa!
Cierra tus ojos profundos. Allí aletea la noche.
Ah desnuda tu cuerpo de estatua temerosa.
Tienes ojos profundos donde la noche aletea:
Frescos brazos de flor y regazo de rosa.
Se parecen tus senos a los caracoles blancos.
Ha venido a dormirse en tu vientre una mariposa
de sombra.
Ah silenciosa!
He aquí la soledad de donde estas ausente.
Llueve. El viento del mar caza errantes gaviotas.
El agua anda descalza por las calles mojadas.
De aquel árbol se quejan, como enfermos, las hojas.
Abeja blanca, ausente, aun zumbas en mi alma.
Revives en el tiempo, delgada y silenciosa.
Ah silenciosa!
Pablo Neruda
sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010
A Abelha
A abelha que, voando, freme sobre
A colorida flor, e pousa, quase
Sem diferença dela
À vista que não olha,
Não mudou desde Cecrops.
Só quem vive
Uma vida com ser que se conhece
Envelhece, distinto
Da espécie de que vive.
Ela é a mesma que outra que não ela.
Só nós — ó tempo, ó alma, ó vida, ó morte! —
Mortalmente compramos
Ter mais vida que a vida.
Ricardo Reis
Abelhas
Gotas de luz e perfume,
Leves, tênues, delicadas,
Acesas no doce lume
De purpúreas alvoradas.
Pingos de ouro cristalinos
Alados na esfera, ondeando,
Dispersos por entre os hinos,
Da natureza vibrando.
Sorrisos aéreos, soltos,
Flavas asas radiantes,
Que levam consigo envoltos
Da aurora os sóis fecundantes.
Da aurora que a primavera
Faz cantar, brota no peito
E floresce em folhas de hera
O coração satisfeito.
Essa aurora produtiva
Do amor soberano e eterno,
Que é nas almas força viva
E nas abelhas falerno.
Nas doudejantes abelhas
Que dentre flores volitam
E do sol entre as centelhas
Resplendem, fulgem, palpitam.
Zumbem, fervem nas colméias
E rumorejam no enxame
Pelas flóridas aléias
Onde um prado se derrame.
Assim mesmo pequeninas
E quase invisíveis, quase,
Com as suas asitas finas,
De etérea de fluida gaze.
Ah! quanto são adoráveis
Os favos que elas fabricam!
Com que graças inefáveis
Se geram, se multiplicam.
Nos afãs industriosos
Que enlevo, que encanto vê-las
Com seus corpos luminosos
D'iriante brilho d'estrelas.
E nas ondas murmurosas
Dos peregrinos adejos
Vão dar ao lábio das rosas
O mel doirado dos beijos.
Cruz de Souza
Os Amores da Abelha
Quando, em prônubo anseio, a abelha as asas solta
E escala o espaço, - ardendo, êxul do corcho céreo,
Louca, se precipita a sussurrante escolta
Dos noivos zonzos, voando ao nupcial mistério.
Em breve, sucumbindo, o enxame arqueja, e volta...
Mas o mais forte, um só, senhor do excelso império,
Segue a esquiva, e, em zunzum zeloso de revolta,
Entoa o epitalâmio e o cântico funéreo:
Toca-a, fecunda-a, e vence, e morre na vitória...
A esposa, livre, ao sol, no alto do firmamento,
Palra, e, rainha e mie, zumbe de orgulho e glória;
E, rodopiando, inerte, o suicida sublime,
Entre as bênçãos da luz e os hosanas do vento,
Rola, mártir feliz do delicioso crime.
Olavo Bilac
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